
À La Garçonne e um desfile que merece ser visto pelas costas
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Setembro 2019—
Nem sob efeito de forte psicotrópico (Bacurau ™) se consegue explicar a alienação do mainstream da moda brasileira. Em pleno sete de setembro de um ano como 2019, em vez de estar nas ruas quebrando postes à la Hong Kong, o metiê se reuniu acontentado para… ver um desfile, como se fosse espetáculo que se comunicasse com este momento específico.
Houve um ensaio de protesto mea culpa nas conversas da entrada, seguindo a marcação dos antibolsonaristas de vestir preto em contraponto com o verde-amarelo da data. Como se fosse um grande esforço para esse grupo vestir preto, veja bem. A aposta foi no conforto da reclamação dentro da bolha como tendência da estação.
Reflexos de uma sociedade acovardada, pode-se dizer. Mas também de momentos complicados para um setor que caminha a passos largos para a irrelevância dentro da discussão cultural.
Das cores nacionalistas, ficaram só a ambiance do aquário do CCSP, com o chão coberto de carpete verde mais um microlosango de fita adesiva amarela no centro.
Era a marcação onde modelos faziam seu show à couture, exibindo os looks da À La Garçonne de-frente-de-lado-de-costas. Era como se fosse uma bandeira minimalista, pisoteada com força pelo casting do desfile sob trilha de Love Parade - mas essa é uma interpretação selvagemente liberta da minha parte.
Fato é que, se não foi um desfile ufanista (ufa), o show da marca também preferiu não mexer nos assuntos correntes - e parcimoniosamente, continuou retroalimentando as imagens do universo criado por Alexandre Herchcovitch sob a direção de Fabio Souza. Ou seja: o streetwear versus o sportswear, as construções refinadas nas modelagens e as mil-e-uma parcerias com outras marcas, o ótimo modelo de “terceirização” que vem funcionando bem por ali desde a primeira coleção.
Houve um ensaio de protesto mea culpa nas conversas da entrada, seguindo a marcação dos antibolsonaristas de vestir preto em contraponto com o verde-amarelo da data. Como se fosse um grande esforço para esse grupo vestir preto, veja bem. A aposta foi no conforto da reclamação dentro da bolha como tendência da estação.
Reflexos de uma sociedade acovardada, pode-se dizer. Mas também de momentos complicados para um setor que caminha a passos largos para a irrelevância dentro da discussão cultural.
Das cores nacionalistas, ficaram só a ambiance do aquário do CCSP, com o chão coberto de carpete verde mais um microlosango de fita adesiva amarela no centro.
Era a marcação onde modelos faziam seu show à couture, exibindo os looks da À La Garçonne de-frente-de-lado-de-costas. Era como se fosse uma bandeira minimalista, pisoteada com força pelo casting do desfile sob trilha de Love Parade - mas essa é uma interpretação selvagemente liberta da minha parte.
Fato é que, se não foi um desfile ufanista (ufa), o show da marca também preferiu não mexer nos assuntos correntes - e parcimoniosamente, continuou retroalimentando as imagens do universo criado por Alexandre Herchcovitch sob a direção de Fabio Souza. Ou seja: o streetwear versus o sportswear, as construções refinadas nas modelagens e as mil-e-uma parcerias com outras marcas, o ótimo modelo de “terceirização” que vem funcionando bem por ali desde a primeira coleção.




Zé Takahashi
A ref principal da vez veio, via um final de anos 1990, do motocross e seus códigos, mais uma olhada forte na “moda de academia” que o público brasileiro usa confortavelmente no dia-a-dia. Daí que saem as cores fortes, as calças radicais (já ensaiando um retorno da cintura baixa, será?), collants, leggings e corta-ventos, além de uma série final de habillé esportivo.


Mas isso tudo, considero moda aplicada em design de produto. E você não quer que eu fique aqui descrevendo produtos (nem a marca precisa). Para essa comunicação, o Instagram institucional da À La Garçonne deve funcionar bem no debulhar dos tênis e óculos e collabs e jaquetas da vez.
O que me soa mais interessante, sempre, é ver como Herchcovitch se aplica em continuar revendo suas fixações de carreira em novos universos - mesmo que ele insista em se colocar apenas como funcionário da casa. E para isso, o terço inicial desta coleção soa mais instigante.
É quando, em contraponto com os quadriculados esportivos que viriam na sequência, Alexandre mostra uma série de construções interessantes. Como se misturasse o guarda-roupa de Tippi Hedren nos filmes de Hitchcock com um desejo de alfaiataria quase Helmut Lang.
E é quando o foco do olhar se move diretamente para… as costas das roupas.
O que me soa mais interessante, sempre, é ver como Herchcovitch se aplica em continuar revendo suas fixações de carreira em novos universos - mesmo que ele insista em se colocar apenas como funcionário da casa. E para isso, o terço inicial desta coleção soa mais instigante.
É quando, em contraponto com os quadriculados esportivos que viriam na sequência, Alexandre mostra uma série de construções interessantes. Como se misturasse o guarda-roupa de Tippi Hedren nos filmes de Hitchcock com um desejo de alfaiataria quase Helmut Lang.
E é quando o foco do olhar se move diretamente para… as costas das roupas.






Valendo-se de penses e drapeados (além do styling), Alexandre fisga o olhar do espectador no pivô da passarela ao perceber que o volume ficou todo para trás. Efeito que vai se perder se você se focar apenas à visão frontal padrão das imagens de desfile.
E aí os blazers ganham formas interessantes; o vestido de alcinha que é quase boboca na vinda, se torna um desbunde de movimento solar na ida; a cintura marcada dá assunto aos borbotões de pano.
Poderíamos fazer aqui também uma alusão aos motociclistas de alta-velocidade, que correm equilibrados em ângulos fora do repertório das pessoas comuns - e exatamente por isso, precisam de uma roupa que, além de proteger, mantenha a liberdade de movimento ao longo da coluna.
E aí os blazers ganham formas interessantes; o vestido de alcinha que é quase boboca na vinda, se torna um desbunde de movimento solar na ida; a cintura marcada dá assunto aos borbotões de pano.
Poderíamos fazer aqui também uma alusão aos motociclistas de alta-velocidade, que correm equilibrados em ângulos fora do repertório das pessoas comuns - e exatamente por isso, precisam de uma roupa que, além de proteger, mantenha a liberdade de movimento ao longo da coluna.



E há as jaquetas jeans refeitas e armadíssimas com barbatanas vitorianas - que, se talvez não necessariamente bonitas à primeira vista, são inegavelmente expressivas na silhueta corseletada.
Pode não ser revolucionário (não precisa ser, nem se propõe a tanto) nem a melhor coleção entre as oito da À La Garçonne (também não precisa).
Mas é um uso de repertório que, mesmo que visto sob a ótica do mau humor da vida real, ainda dá uma graça para esse mundinho. Que pode estar desmoronando, mas sabe fazer coisas interessantes quando quer.
Pode não ser revolucionário (não precisa ser, nem se propõe a tanto) nem a melhor coleção entre as oito da À La Garçonne (também não precisa).
Mas é um uso de repertório que, mesmo que visto sob a ótica do mau humor da vida real, ainda dá uma graça para esse mundinho. Que pode estar desmoronando, mas sabe fazer coisas interessantes quando quer.